O Óbvio

Por Rubens Queiroz de Almeida

Em um de meus artigos, publicados no boletim Nova Educação, um leitor reclamou de que eu havia escrito o óbvio.

Na verdade eu sempre tenho esta sensação incômoda, de estar sempre escrevendo o óbvio, coisas que muitos já disseram antes de mim. Entretanto, algo que pude constatar ao longo dos anos, é que o que é óbvio para alguns nem sempre o é para muitos.

Mesmo na área de informática, em que trabalho, o pensar de que algo é óbvio e não deve ser comentado já trouxe muitos problemas. O que é considerado óbvio por um especialista dificilmente receberá a mesma avaliação por parte de um iniciante.

Muitos anos atrás, quando eu estava começando em minha carreira de informática, nós montamos uma lista de discussão pela Internet para que pudessemos compartilhar informações sobre administração de redes de computadores. A maioria de nós era iniciante e estávamos ávidos por compartilhar idéias e nos ajudar em nossos problemas do dia a dia. Um dos assinantes, todavia, era um profundo conhecedor do assunto. Praticamente todas as nossas dúvidas eram “idiotas” no seu ponto de vista e ele não hesitava em nos dizer isto, de forma nem sempre muito educada. Em poucos dias a nossa lista, que tinha por objetivo ser um espaço amigável para troca de idéias, se converteu em um deserto, onde ninguém se arriscava a falar. Se falasse, possivelmente estaria expressando uma “obviedade” e sendo claramente rotulado de idiota ou algo pior pelo nosso especialista. Não preciso dizer que a lista morreu e cada um foi cuidar da sua vida. Ninguém mais teve coragem de falar nada, ao menos naquela lista.

A forma como aprendi inglês, por exemplo. Eu descobri a maior parte das minhas técnicas sozinho. Ninguém nunca me orientou sobre como estudar. Para mim estas estratégias funcionaram muito bem, com ótimos resultados. Mais tarde, ao pesquisar em diversos livros, em busca de fundamentação teórica para escrever sobre o assunto e também para dar aulas, descobri que a maior parte das minhas estratégias eram amplamente conhecidas. Só que ninguém me contou e eu não sabia, quando era estudante, onde procurar. Se eu soubesse possivelmente poderia economizar muito tempo em meus estudos e aprender mais rápido.

Muito embora as idéias que descobri eram, em sua maior parte, amplamente conhecidas, me dei ao trabalho de documentá-las em meus livros e nos artigos do boletim Nova Educação. Cada pessoa é diferente e a maneira como aplica regras amplamente conhecidas também será diferente. A forma como nos expressamos, pode ser mais didática por ter uma maior afinidade com a experiência de vida do leitor. A mesma idéia ou processo, quando apresentada por pessoas diferentes poderá ter um impacto também completamente diferente.

Outro fato interessante. Escrevi um livro chamado As Palavras Mais Comuns da Língua Inglesa, onde exponho uma metodologia para o ensino da leitura da língua inglesa. Certa vez encontrei um leitor do meu livro super entusiasmado. Ele havia conseguido aprender a ler inglês muito rapidamente usando o meu livro. Quando ele me contou como usou o meu método, eu vi que, a partir das minhas idéias, ele havia construído uma metodologia inteiramente sua, com excelentes resultados. O meu livro foi apenas uma centelha que desencadeou um processo de aprendizado próprio que refletiu a vivência daquele leitor em particular. Como sempre digo em minhas aulas, o que ensino não deve ser tomado ao pé da letra. O que conta, antes de mais nada, é a experiência de vida de cada pessoa. Receitas prontas raramente funcionam.

O que realmente acontece é que um livro ou um artigo ou uma idéia, na verdade são muito mais. Cada leitor cria a sua versão do que lê. Um escritor não escreve apenas um livro, mas tantos livros quantos forem os seus leitores.

Por todas estas razões, admito sinceramente que não tenho nenhuma vergonha de escrever o óbvio. Certamente para algumas das pessoas que lerem meus artigos, a minha obviedade certamente poderá fazer diferença. Além do mais, gosto muito de compartilhar minhas descobertas e fico mais feliz ainda quando descubro que a minha experiência pode ser útil a alguém. Não me agrada a idéia de ir para o túmulo com todas as minhas experiências guardadas dentro da minha cabeça. Vivemos hoje em uma era em que a comunicação instantânea, com milhares ou mesmo milhões de pessoas é uma realidade. As idéias trafegam com mais rapidez e são também aperfeiçoadas na mesma velocidade. Por isto, não tenha receio de escrever o óbvio ou mesmo de perguntar o óbvio. As suas idéias poderão ser adotadas por outras pessoas e crescer, ser aperfeiçoadas, ficar mais bonitas e quem sabe, ajudar muita gente.

Certamente sempre existirão “especialistas” que irão ridicularizar o seu conhecimento, mas para cada uma destas pessoas negativas existem outras muitas que terão um enorme prazer em oferecer ajuda generosamente.

Relembrando, George Bernard Shaw disse uma vez:

If you have an apple and I have an apple and we exchange apples then you and I will still each have one apple. But if you have an idea and I have an idea and we exchange these ideas, then each of us will have two ideas.

Se você tem uma maça e eu tenho uma maça e nós trocamos nossas maças, então eu e você ainda teremos uma maça. Mas se você tem uma idéia e eu tenho uma idéia e nós trocamos estas idéias, então cada um de nós terá duas idéias.

Continuando nesta linha, alguém que já não me lembro, disse também que o conhecimento é a única coisa, que quanto mais compartilhado, mais cresce.

Portanto, vou continuar escrevendo sobre o óbvio, perguntando o óbvio e respondendo sobre o óbvio com a maior boa vontade.

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