Contradições do aprendizado tradicional de idiomas

© Walther Hermann Kerth

Desde que, como já mencionado em outros artigos publicados, as taxas de sucesso do aprendizado convencional de idiomas estrangeiros (especialmente o inglês) sejam tão desanimadoras, algo deve ser feito para mudarmos esses resultados. Dessa forma, se esse texto despertar sua curiosidade ou insatisfação, isso contribuirá para uma grande reflexão e, quem sabe, revisão nos métodos convencionais.

Em primeiro lugar, considero que até mesmo os adultos sejam tratados como crianças nesses tipos de cursos, você não concorda? Que prova ou avaliação melhor, existe para um adulto, do que a experiência diária de utilização daquilo que aprende? São pressionados e comandados em seu processo de descoberta e aprendizado, será que não existiria uma forma de motiva-los a buscar e aprender em suas próprias áreas de interesse? Da mesma forma que as mais modernas doutrinas de ensino infantil estão propondo a educação das crianças (métodos ainda restritos à educação particular na maior parte das vezes).

Além disso, os métodos convencionais viraram de ponta-cabeça o processo natural de aprendizado de uma criança (que, por sinal, é parte da história de todos nós!), ou será que você já viu uma criança aprender gramática ou conjugação verbal antes de saber falar! Será também que você já viu uma criança aprender a falar sua própria língua em salas com outras crianças do mesmo nível? Não, elas aprendem no caos, junto com adultos e crianças de diferentes níveis que, paulatinamente, vão lhes ensinando e corrigindo através do uso repetido.

Outro grande mito que, em geral, justifica o baixo desempenho do aprendizado de adultos é que as crianças aprendem com muito mais facilidade… Você já viu uma criança aprender o idioma materno (a ponto de manter uma conversa) antes de ter aproximadamente três ou quatro anos? Se lembrarmos que o aprendizado da língua mãe começa ainda no útero (através das estimulações táteis do movimento rítmico respiratório da mãe e dos resíduos de sons que possam captar), esse complexo processo leva ainda mais alguns meses. É tão complexo que a criança terá que aprender simultaneamente a coordenar todo o aparelho respiratório e a emissão ordenada de sons, aprender a pensar de uma forma logicamente estruturada (sintaxe da linguagem), padrões de comunicação gestual e tonal, além de memorizar as palavras de seu repertório inicial! Entretanto, todos nós conhecemos algum adulto ou pessoas a quem atribuímos a facilidade de aprender outros idiomas; e que aprenderam em alguns meses ou poucos anos… É muito mais fácil para um adulto, não somente porque já conhece o caminho (o processo – já aprendeu o primeiro e mais difícil idioma, chamado de língua mãe), mas também porque já sabe pensar de uma forma logicamente estruturada além de saber coordenar seus aparelhos fonador e respiratório!

Então eu pergunto, por que abandonar um processo de aprendizado que já garantiu o sucesso no aprendizado do primeiro e mais difícil idioma? Lembre-se que as pessoas a quem atribuímos a facilidade de aprender idiomas não possuem, de fato, um olho ou um ouvido a mais, nem sequer uma outra boca que lhes tornasse tal desafio mais fácil! Apenas usam seu aparato sensorial de uma forma mais produtiva para essas aprendizagens específicas.

É quase unânime a ponderação de que a melhor forma de aprendermos uma língua estrangeira é realizada ao nos mudarmos para o país de origem dessa língua. Nessas circunstâncias, o aprendizado é admitido como sendo completamente caótico. Contraditório, não? Por que, então, as escolas convencionais tornam as aulas tão organizadas e lineares?

Há algo ainda bastante interessante. Todos nós temos dito que talvez seja mais difícil aprender a primeira língua estrangeira, porém para aprendermos a segunda, a terceira etc., admitimos ser progressivamente mais fácil. O que é que aprendemos além da língua que nos torna mais fáceis os próximos desafios de aprendizados? Aprendemos a aprender! Distinguimos o que é importante do que não é, aprendemos a perceber, descobrimos como memorizar e como nos lembrar, como construir a nova identidade lingüística (isso mesmo, uma nova identidade psicomotora), aprendemos a nos concentrar e a nos expressar com outras sonoridades. Encontramos o caminho das pedras ou a receita de bolo de como abordar o próximo desafio de aprender uma nova língua estrangeira, quer conscientemente ou não.

Outro paradoxo interessante, você sabia que os arquivos de memória do idioma falado e da língua compreendida intelectualmente são diferentes? Isso justifica o fato de existirem pessoas que falam, mas não escrevem, ou pessoas que lêem e escrevem, mas não falam ou entendem o discurso! Aprender com qualidade, portanto, significa desenvolver cada uma dessas diferentes habilidades coordenadamente com as outras.

Se acreditarmos que a educação e as tecnologias de aprendizagem de massas ainda são alguns dos campos do conhecimento mais atrasados e obsoletos de nossa civilização, certamente essa doutrina se estende ao universo do aprendizado de idiomas também, e não somente no Brasil!!!!!!! Pense, por exemplo, na quantidade de analfabetos funcionais, aqueles que embora saibam escrever, reconhecer letras e pronunciar os sons das palavras, não sabem compreender aquilo que lêem nem sequer expressarem-se através da escrita…

Bem, no que diz respeito ao aprendizado de idiomas, algumas dessas contradições mencionadas deram impulso para uma pesquisa sobre como seria possível aprendermos com mais facilidade, naturalidade e prazer, e se transformou num programa de treinamento chamado OLeLaS (Sistema Aberto de Aprendizado de Idiomas), cujo seminário mais conhecido é apresentado pelo IDPH com o nome de “Memorização e Motivação para Aprender Idiomas” cujo principal objetivo é ensinar os estudantes de idiomas a “pescar” em vez de lhes “vender peixes”.

Reedição do livro “O Salto Descontínuo”<BR> © 1996, Walther Hermann

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